Periódicos farmacêuticos: homens ainda são maioria em conselhos editoriais

É o que revela pesquisa que contou com a colaboração de farmacêutico da UFRRJ, em parceria com pesquisadoras da UERJ e do Instituto Politécnico de Lisboa

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O professor Tácio de Mendonça Lima, do Departamento de Ciências Farmacêuticas da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) foi um dos colaboradores da pesquisa sobre a presença das mulheres em conselhos editoriais de periódicos científicos na área de farmácia social, clínica e educacional. Junto às pesquisadoras Graziela dos Santos Massa, do Programa de Pós-graduação em Odontologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), e de Fernanda Stumpf Tonin, da Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Instituto Politécnico de Lisboa (Portugal), Tácio de Mendonça Lima disse que a ideia do trabalho surgiu de uma hipótese empírica relacionada à existência de um número maior de mulheres na área farmacêutica, tanto na prática como na academia e pesquisa. "Porém, supomos que isso não acontecia nos cargos de liderança", explicou.

Para investigar a desigualdade de gênero nesses conselhos editoriais, o primeiro passo dos pesquisadores foi identificar, nas bases de dados Scimago Journal & Country Rank (Acesse aqui) e Clarivate Analytics Web of Science Journal Citation  Reports (Acesse aqui), os periódicos com o perfil desejado, ou seja, aqueles relacionados às áreas de farmácia social, clínica e educacional. Entre setembro e outubro de 2022, um total de 45 periódicos foi localizado e, entre estes, 42 foram analisados. 

O resultado apontou que, apesar do avanço da inserção das mulheres no campo científico, as pesquisadoras estão sub-representadas em conselhos editoriais desses 42 periódicos científicos avaliados. Foi verificado que, entre os 1.482 membros de conselhos editoriais destes periódicos, somente 527 eram do sexo feminino (35,6%). Apenas nove periódicos (21,42%) apresentaram mais mulheres entre seus membros do corpo editorial, são eles: Revista Cubana de Farmacia; Revista de Ciencias Farmaceuticas Basica e Aplicada; American Journal of Pharmaceutical Education; Research in Social and Administrative Pharmacy; Currents in Pharmacy Teaching and Learning; American Journal of Health-System Pharmacy; Hospital Pharmacy; Acta Pharmaceutica; e Pharmacy Education.

Por meio de um olhar mais aprofundado, foi estudada a distribuição dos integrantes dos conselhos em quatro cargos – editor-chefe, coeditor, editor associado e consultor editorial -, classificando-os com relação ao sexo (feminino ou masculino). Dessa forma, observou-se que entre os 47 editores-chefes, apenas dez eram mulheres (21,2%). Já entre os coeditores, dos 44 identificados, 21 eram mulheres (47,7%). Com relação aos 272 editores associados, 115 foram identificados como do sexo feminino (42,2%). E, por fim, entre os 1.119 consultores editoriais localizados, apenas 381 eram mulheres (34%).

"Infelizmente o resultado corrobora com a nossa hipótese inicial, com dados não animadores de paridade de gênero. Apenas 35% do corpo editorial de 45 revistas mais conceituadas da área clinica, social e educacional da farmácia são de mulheres, sendo apenas 9 delas com maior percentual do sexo feminino. Se pensarmos que cerca de 65% da profissão farmacêutica mundial é composta por mulheres, os resultados só evidenciam essa desigualdade", lamenta o professor da UFRRJ Tácio de Mendonça Lima. 

Parceria

                              

Graziela dos Santos Massa                       Tácio de Mendonça Lima                             Fernanda Tonin

O docente elogia a iniciativa e o trabalho das colegas Graziela Massa e Fernanda Tonin em promover a pesquisa. "A Graziela Massa trabalha com equidade de gênero na área de odontologia e a Fernanda Tonin está na lista FIPWISE rising stars da Federação Internacional de Farmacêuticos, pelo reconhecimento como pesquisadora de alto impacto na área da farmácia". 

Quando pensamos que a avaliação da produtividade dos cientistas passa pelo número de publicações em periódicos científicos o que pode, até mesmo, influenciar na progressão da carreira científica, a discussão sobre a sub-representação das mulheres no processo editorial torna-se ainda mais premente.

 “Nossa pesquisa traz um alerta pois, apesar de avanços na inserção das mulheres na área acadêmica, ainda vivenciamos uma não paridade de gênero nos conselhos editoriais de revistas farmacêuticos mundo a fora”, observa Tácio de Mendonça Lima.

Para o professor, como o trabalho avaliou a participação de mulheres nos conselhos editoriais das revistas, o primeiro passo para mudar esse panorama seria divulgar e confrontar os resultados de maneira séria para que sejam criadas estratégias para aumentar o número de participantes mulheres nesses conselhos. "É preciso criar grupos de trabalho com mulheres cientistas, mentoring relacionado a formação profissional, apoio e valorização de pesquisas com mulheres líderes, como estratégias que podem incentivar a paridade de gênero nesse contexto".

Artigo científico

MASSA, Graziela dos Santos; TONIN, Fernanda Stumpf; LIMA, Tácio de Mendonça. Female representation among editorial boards of social, clinical, and educational pharmacy journals.
Research in Social and Administrative Pharmacy. Disponível on-line em 6 de março de 2023.

Periódicos do CFF

Nos cinco periódicos publicados pelo Conselho Federal de Farmácia (CFF) e Centro Brasileiro de Informação sobre Medicamentos (Cebrim/CFF) a representação feminina é alta. Dos 58 envolvidos na produção destes materiais, 37 são mulheres, inclusive como editoras-chefes. Letícia Nogueira, do Cebrim, é a editora-chefe do Boletim Farmacoterapêutica. Ela ingressou no CFF há 5 anos e está há 2 como editora.   

Letícia diz que na equipe editorial do boletim Farmacoterapêutica, 50% dos editores associados e 78% dos editores de revisão são mulheres. "Tenho muito orgulho desses dados, pois mostram que somos a maioria na equipe editorial, o que nos permite debater sobre pontos de vista que não eram considerados no nosso âmbito profissional".  

A farmacêutica destaca que a luta das mulheres por seu espaço nas atividades sociais e econômicas só foi possível devido ao movimento feminista que encorajou muitas mulheres a buscar sua autonomia, liberdade e segurança e que vem consolidando o empoderamento feminino atual. "Sei que ainda não vencemos os desafios da paridade de gênero na produção científica e no corpo editorial de periódicos científicos. Apesar de nunca ter desanimado diante dos obstáculos, já duvidei diversas vezes da minha capacidade. E a necessidade de provar nossa capacidade no exercício de um trabalho é desgastante. Mas sigo aprendendo, desconstruindo ideias e crescendo com os desafios, entre eles ser editora-chefe de uma revista", afirma a farmacêutica do CFF.