Pejotização fragiliza vínculos e ameaça direitos trabalhistas de farmacêuticos

CFF e CRFs têm intensificado a fiscalização para coibir a prática

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O fenômeno da pejotização — quando empresas contratam trabalhadores como pessoas jurídicas (PJs) em vez de empregados formais — tem se expandido em diversas áreas do mercado brasileiro, trazendo consequências diretas para categorias que exigem vínculo trabalhista, como a dos farmacêuticos. A subprocuradora-geral do Trabalho, Ileana Neiva Mousinho, levantou essa questão durante o Fórum Nacional de Luta pela Valorização Farmacêutica, em Brasília.

De acordo com a especialista, a prática disfarça relações de emprego e precariza direitos, ao retirar garantias previstas na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), como férias, 13º salário, FGTS e proteção previdenciária. Embora a pejotização seja muitas vezes apresentada como forma de “flexibilização” das relações, na prática ela transfere riscos ao trabalhador e mascara a subordinação típica de um vínculo empregatício.

No caso dos farmacêuticos, o problema se torna ainda mais grave. A legislação que rege a profissão prevê que, para assumir a função de Responsável Técnico (RT) em farmácias e drogarias, o profissional precisa ter carteira assinada ou ser proprietário do estabelecimento. A Resolução nº 14/2024 do Conselho Federal de Farmácia (CFF) reforçou essa exigência ao extinguir a possibilidade de que contratos de prestação de serviços sejam usados como comprovação do vínculo. A medida busca coibir fraudes e assegurar que o farmacêutico, profissional que contribui para a melhoria da saúde da população, atue em condições formais de trabalho.

Ileana Neiva Mousinho afirma que a pejotização aplicada a farmacêuticos “não se enquadra como prestação de serviços a terceiros”, já que o profissional não possui autonomia plena sobre seu trabalho, mas está inserido diretamente na estrutura da empresa contratante. “Trata-se de uma relação com pessoalidade, habitualidade, subordinação e onerosidade — todos elementos que configuram vínculo empregatício”, explica.

O Conselho Federal de Farmácia e Conselhos Regionais têm intensificado a fiscalização para coibir a prática. Quando constatada a pejotização em situações que exigem vínculo formal, os contratos são considerados nulos, com base no artigo 9º da CLT, que invalida atos que visem fraudar a relação de emprego.

Para a subprocuradora-geral do Trabalho, a pejotização não apenas ameaça direitos individuais, mas também fragiliza a profissão. “O farmacêutico contratado como PJ perde força de negociação, fica sem respaldo sindical e ainda assume obrigações tributárias que não lhe caberiam se fosse empregado”, aponta Mousinho.

Enquanto empresas enxergam na pejotização uma maneira de reduzir custos, juristas alertam que a prática pode ser, até mesmo, prejudicial, pois pode acarretar em autuações administrativas e ações na Justiça do Trabalho que, frequentemente, reconhece o vínculo formal, obrigando contratantes a arcar com salários, verbas rescisórias e indenizações retroativas.

O problemática entre flexibilização e proteção dos direitos trabalhistas permanece em evidência no Brasil. No caso dos farmacêuticos, é indiscutível que não há espaço legal para pejotização na função de Responsável Técnico. A prática, além de ilegal, compromete a valorização da categoria e coloca em risco direitos conquistados ao longo de décadas de luta trabalhista.