Chikungunya mata mais que a dengue no Ceará, revela estudo com participação de farmacêutica, publica

O estudo é assinado pelo pesquisador da University of Texas Medical Branch William Marciel de Souza, que divide a primeira autoria do estudo com a farmacêutica Shirlene Telmos Silva de Lima

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No estado do Ceará, unidade da federação com maior número de casos de chikungunya no país (77.418 registros durante as três maiores ondas epidêmicas em 2016, 2017 e 2022), a doença está matando com maior frequência que a dengue. O estado contabilizou 1,3 óbito por mil casos diagnosticados por chikungunya. Já a taxa de mortalidade da dengue no Ceará é de 1,1 óbito por mil casos. Os dados foram mostrados em estudo epidemiológico sobre o tema, publicado na revista The Lancet Microbe, no dia 06/04. 

O estudo é assinado pelo pesquisador da University of Texas Medical Branch William Marciel de Souza, que divide a primeira autoria do estudo com a farmacêutica Shirlene Telmos Silva de Lima, pesquisadora do Laboratório Central de Saúde Pública do Ceará e do Departamento de Genética, Evolução, Microbiologia e Imunologia do Instituto de Biologia da Unicamp (IB-Unicamp). A partir das análises, os pesquisadores foram capazes de determinar, também, o padrão de disseminação da doença e os fatores de risco que podem servir de base para a elaboração de estratégias efetivas de controle, prevenção e tratamento.

Quando o vírus causador da chikungunya foi introduzido no Brasil, há quase uma década, acreditava-se que o país registraria uma ou, no máximo, duas ondas curtas e explosivas, com exposição de grande parte da população, seguidas de um hiato considerável de anos. Porém, o que se observa são epidemias consecutivas e recorde de casos nas Américas – mais de 1,2 milhão registrados. É importante lembrar que não há vacinas ou medicamentos disponíveis para prevenir ou tratar a infecção.

Diferentemente da dengue (cujo vírus possui quatro sorotipos diferentes), a chikungunya não deveria causar reinfecções. E, para entender as causas do diferenciado padrão americano de disseminação, pesquisadores do Imperial College (Reino Unido), do Laboratório de Saúde Pública do Ceará, do Ministério da Saúde, das universidades Estadual de Campinas (Unicamp), de São Paulo (USP) e Federal de Roraima (UFRR) e da University of Texas Medical Branch (Estados Unidos) se debruçaram sobre dados de sequenciamento genômico, de distribuição de vetor e informações epidemiológicas de casos confirmados.

O estudo, que contou com apoio da FAPESP por meio de três projetos diferentes, revelou que, entre março de 2013 e junho de 2022, o país enfrentou sete ondas epidêmicas, com 253.545 casos confirmados por laboratório em 3.316 (59,5%) municípios. Cada região funcionou como um “pequeno bolsão” da doença e foi afetada de forma diferente em cada momento. No Ceará, os municípios que mais sofreram nas duas primeiras ondas foram os que menos somaram casos na terceira.

“Os resultados mostram que a dinâmica da dispersão do chikungunya é diferente da observada no caso da dengue e, provavelmente, da zika: ele não está reinfectando a população, mas causando surtos explosivos em lugares com baixa exposição prévia ao vírus”, explica William Marciel de Souza, em entrevista à Agência Fapesp. “Como o Brasil é um país de dimensões continentais e o mosquito transmissor está virtualmente presente em todos os municípios, vivemos um ciclo interminável”, acrescenta. “Mudamos ainda um paradigma importante com este estudo: o de que apenas a dengue seja uma doença grave – chikungunya, além de debilitante, é também mortal”, completa Shirlene Telmos Silva de Lima, na mesma reportagem.

Saúde pública

De acordo com os pesquisadores, o panorama traçado pelo estudo indica que as subsequentes epidemias de chikungunya não serão encerradas sem intervenções de saúde pública – como evidência, citam o surgimento de uma nova onda este ano, desta vez em Minas Gerais, Mato Grosso do Sul e Tocantins.

“Considerando o tamanho continental do Brasil, com mais de 5 mil municípios, nosso trabalho fornece conhecimento para estudos posteriores determinarem e priorizarem áreas mais suscetíveis a chikungunya, o que ajudará na criação de ações mais focadas de agentes de saúde pública’, diz de William de Souza. “Além disso, capacitar médicos que atendem grupos mais suscetíveis a mortes para realizar intervenções com agilidade.”

A pesquisa também recebeu apoio de instituições como Burroughs Wellcome Fund, Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, Global Virus Network, Medical Research Council e Wellcome Trust. 
O artigo Spatiotemporal dynamics and recurrence of chikungunya virus in Brazil: an epidemiological study pode ser lido em: www.thelancet.com/journals/lanmic/article/PIIS2666-5247(23)00033-2/fulltext.


 Fonte: Comunicação do CFF com informações da Agência Fapesp e do G1