Ativista que garantiu medicamentos gratuitos contra HIV relembra trajetória

Aos 62 anos, Nair Brito conta como sua luta judicial abriu caminho para o acesso universal aos antirretrovirais no SUS

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Nair Brito, 62 anos, descobriu o diagnóstico de HIV em 1992 e transformou a própria história em ação coletiva. Quando enfrentava um quadro grave no hospital, entrou na Justiça para obter antirretrovirais sem custos. A vitória criou precedente e estimulou outras pessoas a exigir o mesmo direito, abrindo caminho para a distribuição gratuita dos medicamentos no país.

Em entrevista à Universa, Nair lembrou que participou de atos públicos para chamar atenção para a falta de assistência. Entre as manifestações, cita o dia em que se deitou na avenida Paulista em protesto. Contou que buscava visibilidade para alertar sobre a necessidade de medicamentos, atendimento adequado e solidariedade.

A mobilização nacional levou o então presidente José Sarney a instituir a obrigatoriedade da oferta de antirretrovirais pelo SUS. Nair diz que gostaria que a legislação tivesse recebido seu nome, mas afirma que essa é uma luta ainda em curso. Ela relembra também o longo caminho de perdas e desafios enfrentado desde a descoberta do vírus.

Nair contraiu HIV após retomar a vida afetiva pouco depois de seu divórcio. Na época, acreditava que a epidemia estava distante de seu universo e restrita a grupos específicos. Os primeiros sintomas a levaram ao médico, que recomendou o teste. O resultado positivo foi recebido sozinha, no estacionamento do laboratório, sem rede de apoio e com medo de contaminar o próprio filho. O impacto emocional a paralisou nos primeiros dias.

Aos poucos, encontrou suporte em amigos e profissionais. Passou por diferentes tratamentos, em um período em que pouco se sabia sobre o vírus e os recursos eram limitados. Aproximou-se de grupos de apoio, como o GAPA, e mais tarde de coletivos como o Mulheres pela Vida, que atuavam por políticas públicas, atendimento digno e combate ao machismo.

As perdas marcaram profundamente sua trajetória. Amigas e colegas de militância morreram em sequência, muitas vezes sem apoio familiar. Nair relata que, em diversos casos, ela e outras ativistas precisavam organizar enterros para pessoas abandonadas. Esses episódios reforçaram sua determinação em lutar por direitos e tratamentos.

A virada ocorreu quando teve contato, em conferências internacionais, com medicamentos mais avançados. Ao voltar ao Brasil, decidiu buscar o novo tratamento. Em meio a uma internação grave, com a imunidade extremamente baixa, ingressou com uma ação judicial para ter acesso ao medicamento. A liminar foi concedida, e o caso repercutiu no país. Pacientes de vários estados passaram a recorrer à Justiça, garantindo o fornecimento de antirretrovirais.

O movimento ajudou a consolidar a política pública que hoje beneficia cerca de 900 mil pessoas no Brasil. Para Nair, essa conquista deveria ser reconhecida como parte de sua história de resistência.

Atualmente, dedica-se à luta pela cura do HIV. Acredita que o avanço científico tornaria possível essa conquista, mas avalia que interesses econômicos retardam as pesquisas. Afirma que o custo elevado dos medicamentos, tanto para ela quanto para milhares de pessoas, movimenta cifras bilionárias. Por isso, reforça que sua causa agora é cobrar investimentos e esforços globais para que a cura se torne realidade.