CFF lança campanha de combate à violência e assédio à mulher, que atinge 23% das farmacêuticas
Intitulada Não se cale, a iniciativa visa estimular as denúncias para reverter as estatísticas de estudo inédito realizado em Minas Gerais. Pesquisa será replicada no país
Mais de 23% das farmacêuticas relatam ter sido expostas à violência no local de trabalho e 13% dizem ter sido agredidas em casa. A presença implacável desse grave problema numa categoria 70% feminina foi evidenciada em pesquisa realizada pela Faculdade de Farmácia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), naquele estado. O relatório do estudo, que será publicado em breve, inspira a campanha do Conselho Federal de Farmácia pelo Dia Internacional da Mulher. 8 de Março. O tema da campanha é “Não se cale!” e as personagens, duas farmacêuticas: Maria da Penha, que dá nome a lei de proteção às mulheres, e Yasminny Couto Ribeiro, de 28 anos, morta pelo ex-namorado, em Sumidouro (RJ).
O CFF, desde 2020, apoia a campanha Sinal Vermelho, desenvolvida pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e a Associação Brasileira de Magistrados (AMB). E, agora, lança uma campanha própria, para incentivar as denúncias, por meio dos canais competentes (veja abaixo). “Queremos chamar esse debate porque as estatísticas mostram que as medidas são urgentes e necessárias”, declara o presidente do conselho, Walter da Silva Jorge João. “Não podemos fechar os olhos para uma situação como essa”, acrescenta Lenira da Silva Costa, vice-presidente do CFF e coordenadora do Grupo de Trabalho Mulheres Farmacêuticas, encarregado de conduzir a pauta dentro da instituição.
A campanha Não se cale será veiculada na internet a partir de 8 de Março. Além das peças publicitárias, que incluem um vídeo institucional e auxiliam na identificação dos diferentes tipos de violência, duas entrevistas – uma com Maria da Penha e outra com a mãe e o padrasto de Yasminny – alertam para o fato de que as quatro décadas que separam os dois casos não foram suficientes para impedir que tragédias como as dessas duas farmacêuticas continuem se repetindo. José Carlos, padrastro de Yasminny, avalia que o rigor da lei parece não estar sendo o suficiente. “Entendemos que fizemos tudo que tínhamos de fazer para proteger a integridade física da nossa menina, mas as três medidas protetivas que obtivemos não evitaram que ela se tornasse mais uma vítima.”
O CFF também vai apoiar o Programa de Pós-Graduação em Assistência Farmacêutica da Faculdade de Farmácia da UFMG na replicação, em âmbito nacional, do estudo realizado em Minas Gerais. O projeto de pesquisa mineiro é amplo. Averiguou aspectos relacionados à saúde integral da mulher, investigou a atuação dos profissionais de Farmácia no cuidado à população feminina e aferiu a percepção sobre a violência contra as mulheres para além delas mesmas. “Além do público feminino, homens e pessoas não-binárias responderam ao questionário”, explica a coordenadora do projeto, a Prof. Dra. Mariana Martins Gonzaga do Nascimento. O resultado mostra que as agressões não são tão veladas: 20,4% dos 455 respondentes da pesquisa afirmaram já ter visto alguma colega farmacêutica sendo vítima de violência ou assédio no ambiente laboral.
A pesquisa identificou também os agressores das mulheres, tanto no ambiente de trabalho, quanto em casa. Na violência doméstica, a maioria das vítimas (13%) são mulheres sem união estável e que têm como algozes ex-companheiros. O resultado surpreende, considerando que mais de 67% das respondentes possuem pós-graduação, ou seja, têm, teoricamente, um nível de esclarecimento alto e autonomia financeira.
No trabalho, as agressões contra mulheres farmacêuticas relatadas são praticadas em sua maioria por clientes ou pacientes (63%). A exposição à atenção sexual indesejada, sofrida por 23% das farmacêuticas, ocorreu mais frequentemente no relacionamento com os colegas e chefes (59,3% dos casos). O que não significa que não tenham sido relatadas investidas também dos pacientes. Pesquisa qualitativa realizada dentro do mesmo projeto de pesquisa, pela farmacêutica Elaine Baptista, conselheira federal de Farmácia suplente por Minas Gerais, mostrou relatos chocantes. Um resumo de sua dissertação de mestrado foi apresentado pela conselheira na Reunião Plenária de fevereiro, em Brasília.
Quando – O questionário da pesquisa a ser realizada pela UFMG com o apoio do CFF já está submetido ao Comitê de Ética da instituição e a expectativa é a de que a coleta de dados com farmacêuticos do Brasil inteiro possa ser iniciada ainda em março. “Conhecer a fundo esse fenômeno da violência contra a mulher farmacêutica é necessário para que possamos traçar estratégias para combater o problema. Não podemos nos omitir em um contexto em que mulheres continuam sendo subjugadas em seus direitos e assassinadas, como a farmacêutica Yasminne, vítima de feminicídio, no Rio de Janeiro”, destaca Walter Jorge João.
Workshop – Também como parte das comemorações pelo Dia Internacional da Mulher, o CFF irá realizar o I Workshop Nacional Mulheres Farmacêuticas. O evento ocorrerá em 28/03, presencialmente, no auditório do CFF, em Brasília. A inscrição é gratuita, com limite de 200 participantes. Quem não puder participar presencialmente poderá assistir por transmissão em tempo real, pelo canal do conselho no Youtube.
Os temas a serem tratados estão sendo elaborados pelo Grupo de Trabalho Mulheres Farmacêuticas do CFF, de acordo com a linha de atuação do GT. O grupo definiu, em seu planejamento estratégico para 2023, atuar em quatro eixos prioritários: Violência contra a Mulher; Saúde Integral da Mulher; Mulher no Mercado de Trabalho; e Mulher na Política.
Onde denunciar
Em situação emergencial: disque 190
É o número de telefone da Polícia Militar.
Nas farmácias/Campanha Sinal Vermelho
A campanha de órgãos do Judiciário tem o apoio do CFF. Envolve farmácias, órgãos públicos e agências bancárias no acolhimento às mulheres, que são orientadas a buscar ajuda apresentando um X vermelho desenhado na palma da mão.
Central de Atendimento à Mulher: 180
O serviço registra e encaminha denúncias de violência contra a mulher aos órgãos competentes, bem como reclamações, sugestões ou elogios sobre o funcionamento dos serviços de atendimento. Funciona 24 horas, todos os dias, e a ligação é gratuita para todo o território nacional e até em outros países.
Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAMs)
São unidades especializadas da Polícia Civil encarregadas da prevenção, apuração, investigação e enquadramento legal nos casos de violência contra a mulher.
Núcleos ou Postos de Atendimento à Mulher nas delegacias comuns
São espaços de atendimento à mulher em situação de violência (que em geral, contam com equipe própria) nas delegacias comuns.
Defensorias públicas e defensorias da mulher
Têm a finalidade de dar assistência jurídica, orientar e encaminhar as mulheres em situação de violência, quando essas não têm condições econômicas de ter advogado contratado por seus próprios meios.
Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos
Pode ser acessada por meio do link https://www.gov.br/mdh/pt-br/ondh.
Medida protetiva
Caso a vítima precise de uma medida protetiva, ela pode solicitar por meio do aplicativo Maria da Penha Virtual, pelo telefone, no número 197, ou ir até uma defensoria pública.
Fonte: CNJ, G1, Senado Federal, www.gov.br.