'Farmácia para cego ver': projeto facilita identificação de medicamentos por pessoa com deficiência

Farmacêutica com deficiência visual do CRF-SP desenvolve método com inserção de QR Code em embalagens e bulas de medicamentos

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Desde 1961, a data de 13 de dezembro é dedicada a celebrar o Dia Nacional da Pessoa com Deficiência Visual. O intuito é combater o preconceito e a discriminação, além de buscar a garantia de direitos e a inclusão das pessoas com deficiência visual na sociedade. E foi de uma farmacêutica do Conselho Regional de Farmácia de São Paulo (CRF-SP) que surgiu um projeto que pode ajudar essas pessoas com problemas na visão a evitar erros na hora de tomar medicamento. O projeto 'Farmácia para cego ver', desenvolvido pela farmacêutica Grayce Miguel França, foi lançado no “Simpósio Tendências Farmacêuticas – Tecnologia e Informação”, promovido pelo CRF-SP, em 26 de novembro. 

Dra. Grayce coordena o Grupo Técnico de Trabalho Farmacêutico à Pessoa com Deficiência no conselho. A ideia surgiu da necessidade da própria profissional, que é deficiente visual, e utiliza a tecnologia do QR Code para ajudar deficientes visuais a identificar medicamentos e a decifrar as informações essenciais de uso. "Trata-se de um método de acessibilidade que emprega QR Code em relevo nas embalagens de medicamentos e bulas, o que facilita a sua identificação pelas pessoas com deficiência visual, idosos e daltônicos", explica Grayce.

A farmacêutica conta que, sendo pessoa com deficiência visual, em sua trajetória profissional buscou pesquisar uma solução que ajudasse a diferenciar embalagens, evitando o uso indevido de medicamento. Ainda segundo ela, somente as inscrições em Braile que vem nas embalagens não trazem as informações imprescindíveis que deveriam conter, como o nome do princípio ativo, dosagem, quantidade, forma farmacêutica e a data de validade.

O Brasil, segundo o Censo, possui cerca de 6,5 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência visual. “Essa solução inovadora permite que todas as pessoas tenham acessibilidade nas embalagens de medicamentos e bulas com segurança”, acrescenta ela.

O método carrega uma proposta de valor para a pessoa com deficiência, garantindo autonomia, segurança, acessibilidade, praticidade e qualidade de vida, a fim de que ela possa ter acesso às informações por meio do celular. Além de medicamentos, o QR Code pode ser utilizado também em embalagens de produtos de higiene e beleza. A farmacêutica diz que está em busca de parceiros para implementar a ideia, como uma empresa inclusiva e que agrega valor aos seus produtos. 

Luta por inclusão - Com apenas 5% de visão nos olhos, Grayce teve os dois olhos afetados ainda durante a gestação, em uma gravidez de gêmeos onde um dos bebês não resistiu. Ela nasceu pesando apenas um quilo e, com apenas dez meses de idade, passou por uma cirurgia no coração. Nada disso a impediu de se tornar farmacêutica, e muito menos de cursar duas pós-graduações.

Ela descobriu o seu amor pela área farmacêutica aos 15 anos. “Com as idas e vindas do hospital, desde sempre eu já sabia que queria seguir na área da saúde. Na adolescência, descobri meu amor pela Farmácia”, contou ao G1, em uma entrevista em 2020.

Na faculdade, as dificuldades só a fizeram querer ainda mais seguir seu sonho. “Minhas provas eram feitas especialmente pra mim, por terem que ser escritas em fonte maior, para eu enxergar”. Grayce contava ainda com o auxílio de professores e colegas de turma para acompanhar as aulas. “Os professores liam as questões das provas que eu não conseguia enxergar. Com as apostilas, meus colegas me ajudavam”, recorda.
No mercado de trabalho, Grayce conheceu a falta de inclusão e suas consequências. “Não respeitavam minha posição de trabalho, achavam que eu não deveria estar lá, além de não adequarem o ambiente de trabalho às minhas necessidades”, desabafa.

Entre as necessidades que sentiu, estava a falta de programas nos computadores para acessibilidade para pessoas com deficiência visual, lupa eletrônica e salas com espaço entre as mesas e cadeiras para melhor acesso. “Sempre esbarrei em mesas e cadeiras, e até caí de uma cadeira com rodinhas.”